cover.jpg
portadilla.jpg

 

 

Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2011 Emilie Rose Cunningham. Todos os direitos reservados.

CORAÇÃO FRIO, N.º 1078 - Agosto 2012

Título original: Her Tycoon to Tame

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

Publicado em portugués em 2012

 

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® ™. Harlequin, logotipo Harlequin e Desejo são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-0595-8

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Capítulo Um

 

Hannah Sutherland pisou a fundo o pedal do carro elétrico e fez com que subisse a toda a velocidade pelo acesso que levava ao edifício principal.

Convidado. No meu escritório. JÁ.

Isso era o que o seu pai lhe tinha comunicado mediante uma mensagem de texto e, por muito irritante que ele tivesse estado ultimamente, Hannah não se atrevia a fazê-lo esperar. No entanto, quem podia ser tão importante para que ela tivesse de deixar tudo e dirigir-se a toda a velocidade para casa?

Quando chegou às escadas que conduziam ao jardim traseiro, carregou no travão, saltou do veículo e entrou rapidamente em casa enquanto alisava o cabelo e esticava a roupa.

Chegou rapidamente à porta do escritório do seu pai e bateu à porta. Um instante depois, esta abriu-se. Brinkley, o advogado da família, apareceu na ombreira. Era amigo e conselheiro legal do seu pai desde que Hannah tinha memória.

– Prazer em vê-lo, senhor Brinkley.

O sorriso de Brinkley pareceu forçado.

– Olá, Hannah. Juro-te que a cada dia que passa te pareces mais e mais com a tua mãe.

– Isso é o que dizem – respondeu ela. Era uma pena que o aspeto físico tivesse sido o único que tinha herdado da mãe.

A vida de Hannah teria sido bem mais fácil se tivesse herdado mais alguns rasgos.

O seu pai estava sentado por trás da secretária, com o rosto tenso e um copo na mão. Era um pouco cedo para beber.

Um movimento junto das portas que davam para o jardim interrompeu-lhe os pensamentos. A outra pessoa que ocupava o escritório virou-se para ela.

Era alto e esguio. Tinha o cabelo castanho-escuro e muito brilhante, curto, mas não o suficiente para ocultar uma verdadeira tendência a encrespar-se que não conseguia suavizar uma dura mandíbula e um queixo quadrado. Ainda que os seus rasgos faciais se combinassem para formar um rosto duro mas atraente, nada poderia conseguir que aqueles olhos frios e desconfiados se suavizassem. Igualmente, nenhum estilista de alta-costura poderia ocultar os seus largos ombros e o seu firme e musculado corpo. Tinha um verdadeiro ar militar, perigoso. Hannah calculava que teria uns trinta e poucos anos, mas era difícil ter a certeza. O seu olhar era o de um homem de mais idade.

– Entra, Hannah – disse-lhe o seu pai. A tensão presente na voz de Luthor fez com que a cautela dela aumentasse. – Brink, fecha a porta.

O advogado assim o fez e Hannah ficou encerrada com os três homens num ambiente de tensão.

– Wyatt, esta é a minha filha Hannah. É veterinária e ocupa-se de supervisionar a criação da Sutherland Farm. Hannah, apresento-te Wyatt Jacobs.

O escrutínio a que Jacobs a submeteu resultou-lhe repulsivo ainda que simultaneamente a atraísse. Quem seria aquele homem? Que tipo de relação poderia ter com a quinta?

A julgar pela roupa cara e o relógio de platina que envergava no pulso, era um homem rico, ainda que sempre o fossem todos os que acudiam à quinta. Os cavalos de pura raça não eram para pessoas de classe baixa ou média. Os clientes de Sutherland Farm iam dos novos-ricos aos membros da realeza, de meninos mimados a ginetes completamente dedicados aos seus cavalos. Em que categoria encaixava Wyatt Jacobs?

Tinha a certeza de que teria uma boa presença sobre um cavalo. Tinha os olhos da cor do café tostado, nos que quase não se distinguiam as pupilas, sobretudo porque o sol entrava a jorros através das vidraças que tinha nas suas costas.

– Bem-vindo a Sutherland Farm, senhor Jacobs – disse, tal como era seu costume, estendendo a mão.

Os longos dedos dele aprisionaram os dela com um gesto firme e ardente. Isso, combinado com o impacto daquele escuro e duro olhar, provocou que a Hannah lhe fosse difícil respirar.

– Doutora Sutherland – disse ele. A sua voz era profunda, algo rouca e muito sensual, perfeita para a rádio.

Ele não lhe soltou a mão, mantendo o contacto e fazendo com que ela desejasse durante um instante ter tido tempo para retocar a maquilhagem, escovar o cabelo e aplicar um pouco de perfume que mascarasse o aroma dos estábulos.

«Tola... É só um cliente. Além do mais, tu não estás à procura de namorado, lembras-te?».

Hannah puxou a mão e, após uma breve resistência, Wyatt soltou-lha. Ela levou a palma da mão contra a coxa. Tinha desfeito o seu compromisso quinze meses atrás e, nesse tempo, não tinha pensado em sexo nem sequer numa ocasião. Até àquele momento. Wyatt Jacobs provocava-lhe um formigueiro em lugares que estavam há muito tempo adormecidos.

O seu pai ofereceu-lhe um copo de conhaque.

– Pai, já sabes que não posso beber quando estou a trabalhar. Ainda me tenho de ocupar do Commander esta manhã.

Sentiu de novo frustração por causa do garanhão que tinha deixado nos estábulos. Commander queria matar o mundo todo, em especial a veterinária encarregue de recolher o seu sémen. Na pista fora um competidor estupendo, mas no estábulo era uma besta sedenta de sangue. Dada a sua ascendência e a sua listagem de campeonatos, não o podia ignorar. O seu sémen era ouro líquido.

O seu pai deixou o copo sobre a secretária, como se esperasse que ela mudasse de opinião. Hannah deixou de lado os pensamentos e centrou-se no convidado. Jacobs observava-a com uma intensidade similar à de um laser que provocava uma estranha reação dentro dela. Sentia desejo de desviar o olhar sem consegui-lo.

– Que o traz aos nossos estábulos, senhor Jacobs? – perguntou-lhe.

– Luthor, importa-se de explicar à sua filha por que estou aqui? – disse Jacobs.

Quando o silêncio se prolongou demasiado, Hannah desviou o olhar do atraente rosto de Jacobs e centrou-o no seu pai. Descobriu que o seu progenitor parecia estar à defesa, como quem se sente constrangido. Com o rosto muito pálido, Luthor esvaziou o copo de um gole e deixou-o com um golpe sobre a mesa. Esse gesto fez com que Hannah se sentisse ainda mais ansiosa.

– Vendi a quinta, Hannah – declarou o seu pai.

Ela pestanejou. O seu pai jamais tivera sentido de humor, mas a ideia era tão descabelada que não podia ser outra coisa além de uma piada de mau gosto.

– Como?

– Tenho lugares que visitar e muitas coisas que ver, algo que não poderei fazer se estiver atado a este negócio todos os dias do ano.

Hannah compreendeu que o seu pai não estava a gozar. O chão pareceu oscilar sob os seus pés, pelo que teve de se agarrar à secretária para não perder o equilíbrio.

– Isso é impossível, pai – conseguiu dizer por fim. – Não podes ter vendido a quinta. Não és capaz de o fazer. Vives para os estábulos.

– Já não.

Não podia ser. Impossível. O medo apoderou-se de Hannah enquanto um frio suor lhe empapava o lábio superior. Com um grande esforço, voltou-se para Jacobs.

– Importa-se de nos dar licença um momento, senhor Jacobs?

Jacobs não se moveu. Limitou-se a observá-la como se tratasse de antecipar a reação que ia ter.

– Por favor – disse ela, com desespero.

Após um instante, ele assentiu. Atravessou o escritório com passo decidido e saiu para o terraço.

– Queres que eu saia também? – perguntou Brinkley.

– Fica, Brink – disse Luthor. – A Hannah poderia ter perguntas que só tu podes responder.

– Pai, o que é que se passa? Estás doente?

– Não, Hannah. Não estou doente.

– Então, como pudeste fazer isto? Prometeste à mãe que te ocuparias sempre desta quinta.

– Foi há dezanove anos, Hannah, e ela estava a morrer. Disse o que tinha de dizer para que ela morresse em paz.

– Mas, e eu? Eu também prometi a mãe e falava a sério. Supõe-se que eu tenho de herdar Sutherland Farm. Suponho que tenho de manter estas terras na família e deixá-las depois aos meus filhos.

– Filhos que não tens.

– Bom, não, ainda não. Mas um dia... Isto não é por me ter negado a casar com o Robert, pois não?

– Era perfeito para ti – disse o pai com desaprovação, – mas, apesar de tudo, negaste-te a assentar a cabeça.

– Não, pai. O Robert era perfeito para ti. O Robert era o filho que sempre desejaste ter. Em vez disso, tiveste-me a mim.

– O Robert sabia como dirigir um estábulo.

– E eu também.

– Hannah, não montas a cavalo. Não competes. O teu coração não está neste negócio nem tens a garra necessária para manter a Sutherland Farm no mais alto dos que competem nos grandes prémios. Em vez disso, desperdiças tempo e dinheiro em animais que deveriam sacrificar-se.

– A mãe também estava a favor do resgate de cavalos e o meu programa de terapia com cavalos é um sucesso. Se desses um vista de olhos às estatísticas e lesses os relatórios...

– Essa parte da quinta termina sempre em números vermelhos. Não tens cuidado com o dinheiro porque jamais tiveste de lutar para o conseguir.

– Eu trabalho.

– Só umas horas por dia – replicou Luthor com desprezo.

– O meu trabalho requer trabalhar oito horas por dia.

– Quando a tua mãe e eu assumimos a responsabilidade da velha plantação de tabaco dos meus pais, este lugar estava a perder dinheiro às mãos cheias. Convertemos Sutherland Farm no que é hoje lutando e esforçando-nos dia a dia. A tua mãe tinha ambição. Tu não. O Robert podia ter conseguido instalar algo de bom senso na tua cabeça e conseguir que concentrasses a tua atenção em passatempos mais adequados, mas não pôde ser, pois não?

Hannah anulou o seu compromisso com Robert no dia em que deu conta de que ele amava os cavalos e a quinta mais do que a amava a ela.

– O Robert não era o homem adequado para mim.

– Tens vinte e nove anos, Hannah. Nenhum homem te chamou a atenção durante mais de uns meses. És demasiado exigente.

– Pai, desculpa por não ter herdado nem a graça nem a habilidade de mãe com os cavalos nem a tua competitividade. No entanto, esta quinta era o seu sonho e agora é o meu. Posso dirigi-la. Talvez não saiba como montar um campeão, mas sei como o criar. Tenho o que faz falta.

– Não, Hannah, não tens. Tens tido alguns sucessos no teu programa de criação, mas falta-te fogo e ambição e não tens cabeça para os negócios. Jamais vais estar preparada para assumires as rédeas da Sutherland Farm.

Hannah encolheu-se. Aquelas palavras tinham-lhe doído, ainda que só confirmavam o que sabia que o seu pai pensava há anos. Apesar de tudo, arderam-lhe profundamente.

– Isso não é verdade.

– Protegendo-te não te beneficio em nada. Eu não vou estar sempre aqui para te manter, Hannah – disse, depois de olhar para o seu amigo. – É hora de ires aprendendo a cuidar de ti sozinha.

– Que queres dizer?

– Vou fechar a torneira.

– O que queres dizer? – repetiu.

– Não te vou continuar a manter nem às tuas causas perdidas.

– Porquê? O que é que vou fazer? Como vou sobreviver?

– Terás de aprender a viver do teu salário.

A dor, o medo e a sensação de traição apoderaram-se dela.

– E não poderíamos ter falado de tudo isto antes que tomasses uma decisão tão drástica?

– E de que teria servido? – replicou Luthor encolhendo os ombros.

– Ter-te-ia feito ver que estás muito enganado. Alguém te deveria ter feito ver que estás muito enganado – disse enquanto olhava o advogado com um gesto de impotência e confusão. O advogado encolheu os ombros. – Esta quinta, esta herdade, está há várias gerações nas mãos da nossa família. Muita gente depende de nós e...

– É demasiado tarde, Hannah – suspirou o seu pai. Enquanto voltava a encher o copo, pareceu um homem velho e cansado.

Hannah dirigiu-se a Brinkley.

– Ele pode fazer isto? E a parte que a minha mãe tinha no negócio?

– Os teus avós puseram a quinta em nome do teu pai antes que ele se casasse com a tua mãe. O seu nome jamais se acrescentou à escritura. Tu já herdaste dela aos vinte e um anos.

A maior parte do dinheiro tinha-se esfumado. Hannah gastara-o nos seus cavalos. Tinha estado muito certa de que o seu pai lhe continuaria a proporcionar fundos para os seus esforços.

De repente, compreendeu tudo. O único que explicava a presença de Wyatt Jacobs ali era que ele fosse o comprador da quinta. O canalha teimoso e conspirador que a tinha privado da sua herança.

O pulso de Hannah ressoava com força nos tímpanos. Se não podia convencer o seu pai ou Brinkley, teria de falar com o mal nascido que lhe tinha tirado o que era seu para o convencer de que se esquecesse do acordo. Depois, poderia tentar encontrar o modo de fazer mudar de opinião o seu pai antes que encontrasse outro comprador.

Saiu para o jardim e viu-o sentado a uma mesa, comendo tranquilamente um prato de bolachas de Nellie e tomando um copo de leite como se não tivesse estraçalhado a sua vida. Dirigiu-se para ele e deteve-se ao seu lado.

– Esta é a minha casa. Você não pode entrar aqui e roubar-me o que é meu. O meu pai está a ter um momentâneo ataque de demência senil e...

Jacobs levantou-se. Era bem mais alto que ela e tinha o rosto impassível.

– Eu não roubei nada, doutora. Paguei um preço mais do que justo.

Tranquilamente, levantou a bolacha e deu-lhe outra dentada. Tanta insolência doía tanto a Hannah como se a tivesse esbofeteado. Então, enquanto observava a bolacha, viu que não era a única afetada pelo ocorrido. Deu meia volta ao notar que o seu pai a tinha seguido ao pátio.

– E a Nellie? Vive conosco desde a morte da mãe. Não tem outro lar nem família. Só nós. Não podes expulsá-la. Ainda é demasiado jovem para se aposentar e, neste momento, é difícil encontrar trabalho.

– O Wyatt prometeu que manterá a Nellie no seu posto de trabalho.

– E que me dizes dos outros empregados? Vai mantê-los a eles também nos seus cargos?

– Deixarei tudo tal qual está enquanto avalio a herdade e o negócio.

– E depois?

– As minhas decisões dependerão do que descobrir.

– E o que há para descobrir? Você adquiriu uns estábulos de primeira classe...

– Hannah – interrompeu-a o seu pai, que tinha saído ao terraço, – o Brink examinará os detalhes do acordo contigo. De momento, o único que precisas de saber é que o Wyatt acedeu a manter todos os empregados durante um ano inteiro a não ser que uma descarada incompetência o empurre a decidir o contrário.

– A Sutherland Farm não emprega incompetentes – sentenciou ela erguendo-se perante tal insulto.

– Nesse caso, ninguém tem nada com que se preocupar.

O desespero apoderou-se dela.

– Pai, por favor. Imploro-te que não faças isto. Tenho a certeza de que há algum modo de que possas desfazer o acordo e dar-me uma oportunidade para te demonstrar que posso dirigir a quinta e...

– Hannah, a venda assinou-se há numa semana. Hoje é simplesmente o primeiro dia em que o Wyatt e eu nos reunimos pessoalmente para falar da transição.

– Há numa semana... – repetiu ela. O seu mundo tinha-se desmoronado sem que ela desse por nada.

– Eu já comprei outra casa e contratei uma mudança – acrescentou o seu pai, provocando a Hannah outro calafrio mais doloroso ainda do que o anterior.

Jacobs ficou tenso ao escutar aquelas palavras.

– Outra casa? E a casinha? – perguntou.

«A minha casa! Onde vou eu viver?», pensou Hannah.

– A Hannah vive na casinha – afirmou o seu pai.

Jacobs apertou os punhos. A ira tinha-lhe acendido o olhar.

Confusa por aquele intercâmbio de olhares e palavras, Hannah olhou-os a ambos alternadamente.

– A minha casa e o meu trabalho são parte de Sutherland Farm. Para aonde vou eu? Onde vou viver e onde vou trabalhar?

O seu pai suspirou e dirigiu-se de novo ao interior do escritório, para o carrinho das bebidas.

– Deixarei que seja o Wyatt quem to explique.

– O Luthor excluiu a casinha e o hectare que a rodeia do acordo. Assim, podes manter a tua casa. Como o teu pai te explicou, como qualquer outro empregado, podes continuar a trabalhar aqui desde que a qualidade do teu trabalho cumpra com os meus requisitos – explicou Jacobs com frialdade.

Aquele homem seria o seu chefe.

– Os seus requisitos? – replicou ela. Pelo tom de voz de Jacobs, deduzia-se que tais requisitos seriam impossíveis de alcançar.

A sua casinha, que fora a casa original dos Sutherland, ficava no meio da quinta. Hannah estaria rodeada de território inimigo, mas, ao menos, teria um telhado sob o qual se abrigar.

Tentou controlar o pânico para poder pensar com clareza.

– E quando vai ocorrer tudo isto?

– Vou exercer como dono desde hoje mesmo e vou mudar-me para esta casa assim que o teu pai a tiver deixado vazia.

Por outras palavras, a vida tal como Hannah sempre a tinha conhecido tinha terminado para sempre.

Capítulo Dois

 

A ira ateou o sangue de Wyatt como se fosse palha a arder. Luthor Sutherland tinha-o enganado deliberadamente. Não tinha intenção alguma de se retirar para a herdade original como tinha feito crer a Wyatt quando fizera questão de que aquele fragmento de terra e o seu conteúdo se excluíssem da venda. Além do mais, a sua filha era um dos empregados que Sutherland se mostrara tão ansioso por proteger. Se Wyatt tivesse sabido, jamais teria acedido a assinar o acordo de empregados sobre o qual Sutherland tanto insistira.

No entanto, se Luthor esperara que mostrasse uma consideração especial para com a sua princesa, ia levar uma desilusão. Se Hannah não fosse capaz de realizar o seu trabalho, seria despedida.

O que mais o enfurecia era que não podia culpar mais ninguém além de si próprio por não ter advertido o engano. Tinha estado imerso na assinatura de um acordo de distribuição internacional e, como não tinha tempo nem interesse nem conhecimentos sobre como dirigir uma quinta de cavalos, delegara o trabalho de encontrar uma que fosse autossuficiente num dos melhores agentes do negócio.

Isso significava que teria de lidar com uma herdeira mimada que vivia há anos dos bolsos profundos do seu pai. Pelo que tinha escutado, era evidente que aquela descrição encaixava perfeitamente com Hannah Sutherland, da sua camisa de seda até às suas polidas botas de salto alto.

Apostava qualquer coisa que Hannah tinha passado a vida a viver da sua beleza e dos seus lindos sorrisos. O seu instinto dizia-lhe que ela só lhe traria problemas e o seu instinto quase nunca se enganava. Não tinha de ver os brincos de diamantes que usava nas orelhas, o caro relógio que ostentava no pulso ou a sua perfeita manicura para confirmar o seu estatuto de princesa consentida.

– Antes de sair hoje, quero o historial de todos os empregados – sentenciou, sem desviar o olhar dos olhos azuis que o contemplavam com profunda desaprovação.

– Trata-se de informação confidencial – protestou Hannah.

– Hannah – disse-lhe o advogado de Sutherland, – como novo dono da Sutherland Farm, o senhor Jacobs pode aceder sem restrição alguma aos historiais dos empregados.

– Mas...

Wyatt dedicou-lhe um duro olhar.

– Começarei com o teu. Imagino o que vou encontrar. Colégios privados. Mordomias. Férias na Europa pagas pela Sutherland Farm.

Hannah olhou-o com desaprovação. A tensão atormentava o seu esbelto e tonificado corpo. Os peitos subiam e desciam rapidamente e, apesar da aversão que ele sentia pelas mulheres mimadas e a ira que sentia dada a sua situação, Wyatt não pôde evitar reparar neles.

Havia algo naquela mulher que chamava poderosamente a sua atenção. Hannah Sutherland tinha uma graça subtil e uma elegância que o atraíam e repeliam ao mesmo tempo. No passado tinha mantido relações com mulheres da sua classe e não tinha saído muito bem parado.

– Formei-me numa faculdade de veterinária de prestígio – disse ela. – As minhas habilitações são válidas e, dado que os Warmbloods são uma raça europeia, visitar quintas já estabelecidas para as estudar e avaliar os seus exemplares para procurar possíveis cruzamentos é uma parte necessária do meu trabalho.

– Tenho a certeza de que tens referências dos teus anteriores trabalhos que provem a tua valia como empregada.

Ela levantou o queixo e olhou-o com desdém, de um modo que só as mulheres abastadas sabem fazer. Tinha aprendido a lição quando tinha dezassete anos e trabalhava no estábulo do seu padrasto. Então, não era suficientemente esperto para saber que as meninas-bem não se casam com rapazes que limpam os estábulos dos respetivos padrastos, por muito íntima que a relação pudesse ter sido.