Portada

Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

© 2010 Lindsay Armstrong. Todos os direitos reservados.

FILHA DA TEMPESTADE, Nº 383 - Outubro 2011

Título original: One-Night Pregnancy

Publicada originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres

© 1999 Penny Jordan. Todos os direitos reservados.

AMOR TRAIÇOEIRO, Nº 383 - 1.10.11

Título original: A Treacherous Seduction

Publicada originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres

Este título foi publicado originalmente em português em 2000

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® ™, Harlequin, logotipo Harlequin e Harlequin Euromance são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® y ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

I.S.B.N.: 978-84-9000-839-3

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Inhalt

Filha da Tempestade

Mapa

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NOVA GALES DO SUL

Amor Traiçoeiro

Mapa

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Epilogo

PRAGA

Promoción

Se gostou deste livro, também gostará desta apaixonante história que cativa desde a primeira até à última página.

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Portada Verano de madreselva

www.harlequinportugal.com

Filha da Tempestade

LINDSAY ARMSTRONG

Portada

1

Estava uma noite terrível na estrada que levava à famosa Costa Dourada australiana.

Não começara assim, embora as tempestades de Verão fossem habituais na zona. Mas aquela tempestade apanhara todos de surpresa, até mesmo os meteorologistas.

Chovia muito e o vento era tão forte que sacudia o carro de Bridget Tully-Smith. A estrada estreita que percorria Numinbah Valley estava a começar a alagar-se, enquanto os limpa pára-brisas se mexiam freneticamente de um lado para o outro.

Fora visitar uma amiga casada, que tinha uma quinta onde estava a criar lamas. Fora um fim-de-semana muito agradável. A amiga tinha uma criança pequena, um marido apaixonado e a sua casa, naquela zona de Numinbah Valley, era simplesmente linda.

Só devia ter demorado uma hora a regressar à costa mas, devido à tempestade, anoitecera mais cedo e Bridget perdera-se. Estava, não sabia como, numa estrada secundária, pouco mais do que um caminho de terra, quando a chuva se tornara torrencial, como se o céu se tivesse aberto e estivesse decidido a alagar a zona.

Pouco depois, encontrou uma pontezinha de cimento ou aquilo que, provavelmente, fora uma ponte, mas que agora era uma corrente de água, que dividia a estrada ao meio. Bridget teve de pisar o travão... E isso esteve prestes a custar-lhe muito caro.

A parte traseira do carro derrapou para um lado e sentiu que batia na água. Sem pensar, Bridget saiu do carro quando a corrente começava a engoli-lo e lutou com todas as suas forças para procurar um promontório.

Encontrou uma árvore e agarrou-se a ela com todas as suas forças, enquanto via, horrorizada, como o seu carro era engolido pela corrente de água. Com o capô para cima e os faróis acesos a iluminar a cena, foi flutuando até desaparecer do seu campo de visão.

– Não consigo acreditar – murmurou, trémula.

Por cima do vento e da chuva pareceu-lhe ouvir o ruído de um motor e viu então que outro carro se aproximava a toda a velocidade.

Não conheciam a estrada? Pensavam que podiam atravessar a ponte se fossem a toda a velocidade? Teriam um jipe? Bridget pensou em todas essas perguntas numa décima de segundo, mas soube imediatamente que devia avisá-los.

Abandonando a segurança precária que o ramo da árvore lhe oferecia, correu para o meio da estrada aos saltos e a abanar freneticamente os braços.

Tinha uma blusa branca e vermelha, e rezava para que se destacasse na escuridão, embora soubesse que as suas calças beges não o fariam, porque estavam encharcadas e coladas às pernas.

«Talvez nada», pensou depois, «conseguisse evitar o desastre». O veículo aproximava-se a toda a velocidade e o condutor nem sequer pisou o travão. Mas quando chegou à corrente de água que cobria a ponte de cimento, tal como lhe acontecera, foi engolido pela água.

Bridget levou uma mão ao coração, porque conseguia ver crianças. Ouviu gritos, viu que alguém abria uma janela... E o carro desapareceu.

Chorando, Bridget tentou imaginar o que podia fazer por eles. Mas não podia fazer nada, senão tentar chegar junto eles a pé. E o seu telemóvel estava no carro...

Contudo, outro veículo apareceu de repente e conseguiu parar antes de chegar à água.

– Graças a Deus – murmurou, enquanto corria para o Land Rover, escorregando na lama.

Um homem saiu do carro antes de ela se aproximar. Era muito alto e usava calças de ganga, botas e uma gabardina cinzenta.

– Pode saber-se o que se passa? O que faz aqui?

Bridget tentou levar ar aos pulmões, mas só pôde contar-lhe o que se passara a ofegar e a tentar não desatar a chorar.

– Havia crianças no carro! Tem um telemóvel? O meu ficou no carro e temos de alertar...

– Não, não...

– Que tipo de pessoa não tem um telemóvel hoje em dia? – perguntou Bridget.

– Tenho um telemóvel, mas não há rede nesta zona.

– Então... – Bridget passou as mãos pela cara, para afastar a água. – Porque não vou com o seu carro procurar ajuda, enquanto tenta fazer alguma coisa?

– Não.

– Porquê?

O estranho olhou para ela em silêncio, durante alguns segundos.

– Não conseguiria chegar muito longe. Houve um aluimento de terra a alguns quilómetros daqui. Aconteceu mesmo depois de eu passar, salvei-me por um milagre – enquanto falava, abriu a porta do velho Land Rover que conduzia. – Vou ver o que posso fazer – acrescentou, tirando uma corda, um machado pequeno, uma lanterna e uma faca de dentro de uma capa de couro, que pôs no cinto.

– Graças a Deus... Vou consigo.

– Não, fique aqui.

– Ouça! Ele virou-se, impaciente.

– A última coisa de que preciso neste momento é de uma rapariga histérica atrás de mim. Só tenho esta gabardina...

– E o que importa? – interrompeu-o. – Não posso molhar-me mais. Além disso – Bridget endireitou-se, orgulhosa, – eu não sou uma histérica. Vamos!

A missão de resgate teria estado condenada desde o começo? Às vezes, fazia essa pergunta a si mesma. Certamente, eles tinham feito tudo o que podiam. Mas seguir o rio com aquela corrente, no meio de uma tempestade, com o vento, as pedras e as árvores a interromper o caminho, não só era lento, como cansativo.

Estava a receber golpes por todo o lado e, alguns minutos depois, quando ainda não tinham visto o carro, doíam-lhe todos os músculos.

Certamente, foi por isso que escorregou, batendo numa cerca que não vira. Um pedaço de arame farpado prendeu-se nas suas calças e não era capaz de se soltar, por muito que tentasse.

– Tire-as! – gritou o estranho, iluminando-a com a lanterna.

Bridget olhou por cima do ombro e esteve prestes a morrer com um enfarte ao ver a tromba de água que se dirigia para ela.

Não pensou. Com um puxão, tirou as calças, mas a tromba de água apanhou-a e ter-se-ia afogado se o estranho não tivesse corrido para junto dela, para atar a corda à sua cintura e puxá-la até a levar para terreno seguro.

– Obrigada – disse Bridget, com falta de ar. – Certamente, salvou-me a vida. Ele não disse nada.

– Temos de subir por aquela colina, porque aqui estamos em perigo. Continue a andar! – ordenou.

E Bridget continuou a andar. Ambos o fizeram até os seus pulmões parecerem estar prestes a rebentar. Mas, finalmente, ele disse para pararem.

– Aqui, venha para aqui – indicou, mexendo a lanterna. – Isto parece ser uma gruta.

Era uma gruta com paredes de rocha, chão de terra e um tecto coberto de arbustos. Bridget deixou-se cair no chão, exausta.

– Parece que alguém vai ter de salvar os resgatadores.

– Costuma acontecer – disse ele, filosoficamente.

Bridget olhou à sua volta. Não gostava muito de sítios pequenos e estreitos, mas o que havia lá fora curou-a da sua claustrofobia, imediatamente.

Pela primeira vez, apercebeu-se de que não tinha calças. E, depois de olhar para as suas pernas nuas, apercebeu-se de que a blusa estava rasgada e deixava a descoberto o sutiã cor-de-rosa, que também estava manchado de lama.

Quando levantou o olhar, viu o seu salvador de joelhos, a olhar para ela com um brilho de admiração nos seus espantosos olhos azuis. Era a primeira vez que reparava nos olhos dele.

Mas ele desviou o olhar, para tirar a gabardina e a camisa aos quadrados, revelando um peito largo e bronzeado, coberto de pêlos suaves e escuros, e uns ombros poderosos. Bridget não conseguiu evitar um momento de admiração, mas depois engoliu em seco, sentindo uma certa apreensão. Ao fim e ao cabo, estavam sozinhos e ele era um desconhecido.

– Chamo-me Adam. Porque não tiras a blusa e vestes a minha camisa? – sugeriu, tratando-a por tu pela primeira vez. – Está relativamente seca. E não te preocupes, eu olharei para o outro lado – Adam atirou-lhe a camisa e, tal como prometera, virou-se.

Bridget tocou na roupa. Sim, estava quase seca e tinha um cheiro masculino a suor e algodão, que era estranhamente reconfortante. E tinha de o fazer, não só porque estava meio nua, mas porque estava cheia de frio.

De modo que tirou a blusa e o sutiã encharcado, e vestiu a camisa a toda a velocidade, abotoando-a com dedos trémulos. Ficava larga, mas pelo menos, fazia-a sentir-se quase decente.

– Obrigada... Adam. Mas tu não vais ter frio? Na verdade, já podes virar-te. Ele fê-lo e voltou a vestir a gabardina.

– Eu estou bem – respondeu, enquanto se sentava no chão. – Não vais dizer-me como te chamas?

– Ah, Bridget Smith – respondeu. Com frequência, usava só uma parte do seu apelido famoso. – Oh, não!

– exclamou – O meu carro!

– Encontrá-lo-ão mais cedo ou mais tarde. Não sei em que estado, mas quando passar a tempestade e as águas voltarem ao seu leito, aparecerá em algum lugar.

– A sério? Tinha as janelas fechadas, mas não tive tempo de o trancar... Toda a minha vida está naquele carro!

Ele levantou uma sobrancelha, surpreendido.

– Toda a tua vida?

– Bom, os meus cartões de crédito, as minhas chaves, o meu telemóvel, a carta de condução... Já para não falar do próprio carro.

– Tudo isso pode substituir-se ou, no caso dos cartões de crédito, podes avisar que desapareceram.

Bridget assentiu com a cabeça, mas a sua expressão continuava a ser pensativa.

– És a menina Smith?

– Não necessariamente – respondeu.

– Mas não tens aliança.

Bridget parou de pensar no caos em que se transformaria a sua vida se não encontrasse o carro, para olhar para o homem que estava preso na gruta com ela.

E depois, pôs a mão por dentro da camisa, para tirar uma corrente de ouro de onde pendia uma aliança.

– Compreendo – disse Adam. – Porque não a tens no dedo?

Ela pestanejou, sem saber o que dizer. Porque, por muito bonito, alto e atlético que fosse, na verdade, era um perfeito desconhecido e devia ter cuidado, não era? Talvez fosse boa ideia inventar um marido.

– Perdi peso e ficava larga. A última coisa era verdade.

– E como é o senhor Smith?

Estava a fazer-lhe perguntas, para fazer com que esquecesse a situação em que se encontravam ou duvidava da sua palavra?

– É muito agradável – respondeu Bridget. – É alto, provavelmente, mais alto do que tu, e quando se despe é uma glória – depois fez uma pausa, perguntando-se de onde saíra aquela frase, de um romance do século anterior? Não sabia porque o dissera, certamente. – E, é claro, está louco por mim.

– É claro – repetiu, com um brilho brincalhão nos olhos que, por alguma razão, a deixou nervosa. – Isso significa que está à tua espera, em algum lugar? Em casa, talvez?

– Sim, claro – mentiu, calmamente.

– Alegro-me, porque imagino que chamará a polícia e os serviços de emergência quando não apareceres.

– Hum... – Bridget ficou corada. – Não, neste momento, está fora da cidade. É só uma viagem de negócios E... Voltará para casa amanhã. Ou depois de amanhã.

Adam estudou-a em silêncio. O cabelo curto era acobreado e nem sequer o passeio perigoso pela corrente conseguira apagar o brilho dos seus olhos verdes. Uns olhos muito reveladores, tanto que tinha a certeza de que estava a mentir. Porque teria decidido inventar um marido?

A resposta era óbvia: ele era um estranho. De modo que Bridget Smith era uma rapariga cautelosa, mesmo numa noite como aquela. Enfim, se se sentia mais segura assim...

– Espera um momento – disse ela, então. – Passei o fim-de-semana em casa de uma amiga e, certamente, estará a tentar telefonar-me agora mesmo. Queria que ficasse a dormir em sua casa, mas tenho de me levantar muito cedo amanhã... Talvez ela chame os serviços de emergência se não me localizar.

– Óptimo! – exclamou Adam, levantando-se. – Vou dar uma olhadela. Se a água continuar a subir, teremos de sair daqui.

A água continuava a subir, mas não à mesma velocidade que antes.

– Penso que podemos relaxar um pouco – informou, voltando para a gruta. – O facto de não subir à mesma velocidade pode significar que começará a descer em breve.

Bridget deixou escapar um suspiro de alívio. Mas durou pouco porque, de repente, ouviram um estrondo e alguma coisa, uma árvore, conforme verificaram depois, rolou pela colina e tapou a entrada da gruta.

Bridget virou-se para Adam, cheia de medo.

– Estamos presos.

– Preso? Eu? – replicou, esboçando um sorriso. – Nem pensar, senhora Smith.

– Mas só tens um machado e uma faca...

– Espantar-te-ias com o que posso fazer com eles.

– És lenhador? Um daqueles que cortam árvores nos concursos?

Por alguma razão, essa pergunta pareceu apanhá-lo de surpresa.

– Pareço ser um lenhador?

– Não, na verdade não. Pareces... Bom, podias ser tudo – Bridget sorriu, nervosa. – Não queria ofender-te.

– Não me ofendeste. E não tens de te preocupar comigo... Nem o senhor Smith.

– Obrigada. Havia uma pergunta naqueles olhos verdes, como se suspeitasse que estava a gozar com ela.

Adam sentiu a tentação de se rir, mas lembrou-se então que, apesar do que dissera, estavam presos na gruta.

Uma hora depois, estavam livres.

Uma hora durante a qual Adam usara uma mistura de força bruta, manobras com a corda e machadadas para mexer a árvore.

– Não sei como fizeste! – exclamou Bridget. – É incrível!

– Uma questão de alavancas. Devemos ter sempre em conta a importância das alavancas.

– Porei isso na minha lista de coisas que devo aprender... Mas a água continua a subir! – gritou Bridget, quando Adam iluminou o exterior da gruta.

– Temos de sair daqui o mais depressa possível. Põe a corda à volta da cintura, assim não nos separaremos. Eu vou primeiro. Estás pronta?

Ela assentiu com a cabeça.

Sair da gruta para procurar um sítio mais alto foi uma tortura e Bridget não sabia quanto tempo tinham demorado a fazê-lo. A colina pela qual tinham de subir estava cheia de rochas e escorregava continuamente, mas seguiu Adam como pôde.

A certa altura, teve de parar, porque sentiu uma pontada nas costas, escorregou outra vez e caiu. Só a corda que tinha à cintura é que impediu que caísse pela colina.

Estavam um ao lado do outro e, enquanto Adam iluminava o caminho com a lanterna, Bridget viu pelo canto do olho que uma rocha enorme começava a resvalar para eles...

Dando um grito, precipitou-se sobre ele para o afastar. Afastaram-se alguns centímetros da trajectória da rocha e o impulso levou-os para uma zona plana, coberta de erva, uma espécie de prado no meio daquela desolação. E, quando Adam o iluminou com a lanterna, viram uma espécie de barracão.

– Graças a Deus – murmurou Bridget, deixando-se cair de joelhos. – Só preciso... De um momento para descansar. Depois, estarei bem – garantiu ao seu companheiro.

Adam ofereceu-lhe a lanterna.

– Segura nisto – pediu. Ela obedeceu, sem pensar, e então sentiu que pegava nela ao colo.

– O que estás a fazer? Já estou bem...

– Cala-te, senhora Smith. Acabaste de me salvar a vida, portanto, isto é o mínimo que posso fazer. Importar-te-ias de iluminar o caminho com a lanterna?

Bridget fê-lo para que pudessem ver para onde iam e, a pouco e pouco, começou a relaxar. Mais do que isso, devia admitir. Adam tinha uns braços surpreendentemente fortes e sentia-se a salvo neles. Além disso, não sabia se teria conseguido levantar-se, porque se sentia tão fraca como um gatinho.

Finalmente, chegaram ao barracão.

– Está fechado – disse Adam, pousando-a no chão.

– Mas numa noite tão horrível e como não viemos para roubar nada, suponho que não se importarão que façamos isto – com um golpe do machado que tinha no cinto, Adam partiu o cadeado.

– Sim, bom, imagino que tens razão – murmurou Bridget. – E podemos sempre comprar um novo.

– Primeiro as senhoras...

Quando entrou no barracão, Bridget deixou escapar um suspiro de aprovação. Era um sítio velho e não parecia particularmente sólido, mas havia palha apoiada numa das paredes e uma cama na outra. Alguns candeeiros pendiam de pregos na parede e havia uma chaleira num fogão, algumas chávenas meio partidas, uma caixa com saquetas de chá e várias toalhas. Ao lado, ferramentas agrícolas, para cavalos, mantas e selas.

E, felizmente, também havia uma lareira de ferro, cheia de papéis e lenha.

– Meu Deus! – exclamou Adam. – Nestas circunstâncias, podíamos dizer que isto é o Hilton. Bridget sorriu, mas depressa perdeu o sorriso.

– Mas as crianças...

– Fizemos o que pudemos – interrompeu-a. – E é um milagre que não nos tenhamos afogado. Pensa que estão bem, que conseguiram sair do carro.

– Talvez haja uma estrada por aqui e possamos procurar ajuda.

– Eu pensei o mesmo. Sabes onde podemos estar?

– Não.

– Eu também não. Na verdade, estou completamente desorientado. Se sairmos daqui agora, podemos perder-nos ainda mais, mas de dia teremos um ponto de referência. Além disso, as equipas de emergência têm procurar pessoas depois de uma tempestade tão violenta. Mas, para o caso de haver uma casa por perto, vou dar uma olhadela.

– Eu vou contigo.

– Não, fica. Tens uma entorse? Dói-te alguma coisa?

– Não, não me parece. Só alguns arranhões e hematomas.

– Viste um tanque ao lado do barracão? Um tanque de água da chuva?

– Não.

– Está ali e cheio de água. Quando me for embora, tira a roupa e põe-na debaixo da torneira, para lavares a lama e o sangue. Isso far-te-á bem. Espera, vou acender a lareira, pois assim poderás aquecer-te quando voltares.

– Mas...

– Nada de «mas», é uma ordem – interrompeu-a.

– Mas não tenho nada para vestir!

– Tens, sim – Adam apontou para umas mantas de cavalo. – Podes embrulhar-te nas mantas.

Adam acendeu a lareira e os candeeiros de parafina antes de sair.

– Tem cuidado – avisou Bridget. – Não gosto de ficar sozinha aqui e também não quero que te aconteça nada. A sério.

Ele inclinou a cabeça para disfarçar um sorriso.

– Não te preocupes, não irei muito longe. Não só porque não quero perder-me, mas porque não quero que acabe a pilha da lanterna. Vejo-te depois.

Bridget olhou para ele enquanto saía do barracão e teve de conter o desejo de ir atrás dele. Conteve-se, porque sabia que não conseguiria segui-lo.

Depois, olhou para a sua roupa. Estava coberta de lama da cabeça aos pés e doíam-lhe as pernas. Devia ter arranhões por todo o lado.

«O mais lógico é lavar-me», pensou. «Se tivesse alguma coisa para vestir para além das mantas de cavalo...»

De repente, encontrou uma resposta para as suas preces. O instinto fê-la procurar debaixo de uma das almofadas da cama e lá descobriu um pijama de flanela amarelo, com ursinhos azuis.

Debaixo da outra almofada havia umas calças de fato de treino e uma t-shirt de homem.

– Que bom! Além de estar confortável, não terão de me salvar enquanto estou embrulhada numa manta de cavalo. E Adam também pode arranjar-se um pouco. Bom, vamos tomar um duche, senhora Smith – encorajou-se.

Foi uma experiência estranha tomar banho debaixo de um tanque de água da chuva, à noite, no meio de uma tempestade.

Levou um candeeiro com ela e, felizmente, encontrou um prego na parede. Com essa luz, conseguiu ver uma árvore enorme atrás do barracão e as ruínas de uma antiga estrutura de pedra.

«Que estranho», pensou, enquanto a água caía no seu corpo. Estava gelada, mas pelo menos, o tanque estava situado num caminho de cimento. E também descobrira um balde com um pedaço de sabonete.

«Alguém costumava tomar banho com água da chuva?», questionou-se.

Depois de se lavar, não ficou para decifrar os mistérios do tanque, mas voltou para o barracão e secou-se à frente da lareira, com a manta.

Mais tarde, examinou-se e, satisfeita ao ver que só tinha alguns cortes sem importância e algumas nódoas negras, vestiu o pijama de flanela.

– Lamento – murmurou, como se falasse com a proprietária. – Comprarei um novo.

Depois, concentrou-se na cozinha e na possibilidade, na maravilhosa possibilidade de fazer um chá quentinho.

Adam voltou quando estava a beber um gole de uma das chávenas rotas.

– Tiveste sorte?

– Não – respondeu ele, tirando a gabardina. – De onde tiraste o pijama?

– Estava debaixo de uma das almofadas – respondeu, apontando para as calças de fato de treino e para a t-shirt. – Parece que alguém vive aqui ou passa aqui algum tempo, pelo menos. Queres um chá? Acabei de fazer.

– Sim, obrigado – disse Adam. – Não há nenhuma moradia por aqui, mas vi várias caixas de tijolos, portanto, certamente, usam o barracão enquanto constroem a casa. O caminho leva a uma cancela de ferro, mas está fechada.

– Talvez haja cavalos.

– Se houver, os proprietários virão para ver se estão a salvo – Adam deixou a chávena sobre a lareira. – E, evidentemente, fizeste caso da minha sugestão – acrescentou, olhando para a sua cara limpa de lama.

– Pensei que era uma ordem. Ele fez uma careta.

– E correu tudo bem?

– Foi estranho – respondeu Bridget. – Mas se eu consegui fazê-lo, tu também consegues.

– Agora mesmo, senhora Smith.

Bridget viu-o fechar a porta do barracão... E continuava a olhar para ela um minuto depois, como se estivesse hipnotizada, a imaginar Adam a tomar banho. Não era difícil imaginar aquele corpo tão grande e tão poderoso, nu, com a água a cair por aqueles ombros tão largos...

Envergonhada, Bridget mexeu-se precipitadamente e chocou contra a beira da cama. «Pareço uma adolescente», pensou, zangada. Com vinte e três anos, era suficientemente madura para reconhecer que se tratava de uma reacção física face a um homem muito atraente. Mas ela era alérgica aos homens muito atraentes, que eram menos do que esperava, não era?

Em qualquer caso, quando Adam voltou do duche, embrulhado numa das mantas e ela se virou enquanto ele mudava de roupa, não conseguiu deixar de o ver na sua imaginação.

«Pára de o fazer, Bridget», repreendeu-se.

Uma hora depois, começou outra tempestade.

Era quase meia-noite.

Adam e Bridget estavam a dormir na cama, quando um relâmpago iluminou o barracão e um trovão ecoou alguns segundos depois sobre as suas cabeças. Ela acordou assustada e Adam abraçou-a para a tranquilizar.

– Não é nada, dorme.

– Eu sei, mas não sofremos o suficiente? E não consigo parar de pensar nas crianças...

– Espera um momento, vou pôr mais lenha na lareira. Volto já.

Quando voltou, como se fosse o mais natural do mundo, pôs as almofadas uma sobre a outra e abraçou-a.

– Conta-me coisas de ti, Bridget.

– O que queres saber?

– O que fazes? Onde nasceste? O que é que os teus pais fazem?

– Trabalho na sala de redacção de uma cadeia de televisão. Por enquanto sou algo parecido com a assistente de todos, mas estou à espera que chegue uma coisa melhor.

Bridget tremeu quando outro trovão fez o barracão abanar.

– E que mais? – insistiu ele.

– Nasci em Brisbane. O meu pai morreu num acidente há alguns anos e a minha mãe voltou a casar. Agora, vive na Indonésia.

– Onde estudaste?

– Estudei Comunicação Social na Universidade de Queensland. O meu pai era jornalista e suponho que herdei o seu interesse por essa profissão – Bridget parou, pensativa.

Gostava do seu trabalho, certamente, mas herdara a paixão do pai, o famoso Graham Tully-Smith, pelo jornalismo? Por vezes, perguntava-se se fora a admiração pelo pai que fizera com que escolhesse esse curso. E, com frequência, sentia-se inquieta, como se quisesse fazer alguma coisa diferente. Mas o quê?

Adam interrompeu os seus pensamentos dizendo:

– E agora, sobre o senhor Smith... Bridget mordeu o lábio inferior.

– A verdade é que não há nenhum senhor Smith. A aliança... – começou por dizer, brincando com o fio,

– é da minha mãe. Mas como éramos estranhos, pareceu-me boa ideia inventar um marido.

– Imaginei que sim.

– Porquê?

– Tens uns olhos muito reveladores. Além disso, parecia mentira.

Bridget ficou corada e, rindo-se, ele passou-lhe um dedo pelo queixo.

– Tens namorado?

Talvez fosse a tempestade, talvez o calor do seu corpo ou a tranquilidade que a sua presença lhe dava, mas fosse qual fosse a razão, Bridget deu por si a contar-lhe coisas que não contara a ninguém. Coisas como ter-se apaixonado loucamente com vinte e um anos, uma relação que acabara por ser um desastre.

– Ele mudou de repente. Tornou-se muito possessivo e, no entanto, muito crítico comigo. Mas isso foi porque... Bom, enfim, eu não tinha jeito para a parte sexual. Penso que foi porque, na verdade, gostaria de ter esperado um pouco, até estarmos noivos.

– Ah, claro.

– Não demorei muito a perceber que tinha ido para a cama com um homem de quem não gostava. Era bonito e divertido, mas... Quando acabámos, quase tinha medo. E, por isso, não voltei a sair com ninguém. Embora não saiba porque estou a contar-te tudo isto.

– Talvez tivesses de me contar – disse ele, acariciando-lhe o cabelo. – Mas as coisas podem ser diferentes com outro homem.

Bridget não parecia muito convencida, mas não discutiu.

– Mas porque te contei? Não tinha contado a ninguém.

– Não sei – Adam encolheu os ombros. – Foi uma noite muito difícil. O medo, o stress, o cansaço e agora uma tempestade de raios e trovões. É normal.

«Não, há mais alguma coisa», pensou Bridget. Havia alguma coisa naquele homem que a atraía a sério. Não só a fazia sentir-se segura, como também fazia com que se sentisse interessada nele, como se quisesse conhecê-lo melhor e...

E o quê? Gostava fisicamente dele, certamente. Adorava as suas mãos e o brilho brincalhão dos seus olhos. E divertia-se ao ver como a franja caía sobre a sua testa.

– Contar torna-te mais humana, «senhora Smith».

Todos cometemos erros na vida – disse ele. Bridget pensou nisso por um instante.

– Sim, suponho que sim.

Adam fez uma careta ao perceber a sua falta de convicção.

– Mas Bridget Smith tem de ser mais do que isso. Diz-me as coisas de que gostas, por exemplo.

– Sou uma pessoa muito normal. Há coisas que faço bem, mas vivo com a esperança de encontrar uma coisa de que realmente goste.

– E que coisas fazes bem?

– Pintar, por exemplo. Houve um tempo em que pensei que seria a próxima Margaret Olley, porque adoro pintar flores, mas não tive sorte. Também adoro pintar paisagens e toco piano, mas nunca serei Eileen Joyce. Uma vez, pensei que gostaria de ser paisagista.

Os meus pais têm uma propriedade e eu adoro plantar coisas, e vê-las crescer. E montar a cavalo, adoro cavalos. Não tenho nenhum, mas tive alguns póneis quando era pequena e trabalho como voluntária numa escola equestre para crianças com deficiência.

– Ah, sim?

– Não me dou mal com as crianças, na verdade – Bridget ficou calada por um instante. – Passo muito tempo a ler, gosto de cozinhar, adoro estar em casa a fazer cerâmica... Ah e canto.

– Profissionalmente? – perguntou ele.

– Não, não. Também pensei uma vez que seria a nova Sarah Brightman, mas não pôde ser. Canto no duche... E em todo o lado.

– Canta alguma coisa.

– Agora?

– Porque não?

Bridget cantou algumas estrofes de Memory e quando acabou, confessou-lhe que era fã de musicais.

– Pareces ser uma rapariga completa – concluiu Adam, esboçando um sorriso. – Noutro tempo, poderias ser uma esposa e mãe adorável de classe alta.

– Isso não parece ser muito divertido – Bridget riu-se. – Mas parece-se com uma coisa que me disse uma professora: «não vais ganhar um prémio Nobel, Bridget, mas és uma rapariga encantadora.» Que emocionante, não é?

– Não sei – Adam sorriu, beijando-lhe a testa. – É bom ser encantador e penso que a tua professora tinha razão.

Ela sorriu também, com um brilho travesso nos olhos.

– Demonstrei-lhe que não era um desastre académico, tirando boas notas na universidade. Mas... Já chega de falar de mim. Conta-me alguma coisa sobre ti.

– Não saberia por onde começar.

– Quantos anos tens? Onde nasceste? O que fazes? Todas essas coisas.

– Tenho trinta e um anos e tu... Vinte e dois?

– Vinte e três.

– Ah, vinte e três – repetiu ele. – Nasci em Sidney e fiz muitas coisas. Tenho jeito para os cavalos, mas a verdade é que costumo andar de um lado para o outro.

– Queres dizer que não crias raízes?

– Exactamente.

– Alguma mulher te enganou ou tiveste uma desilusão amorosa?

Por alguma razão, a pergunta, feita com uma mistura de sabedoria e compaixão, fez com que Adam olhasse para ela nos olhos durante alguns segundos, em silêncio.

– Podemos dizer que sim.

– Gostarias de me contar?

– Não, é melhor não.

O seu cabelo secara e parecia mais claro do que antes, quase de cor dourada. Os seus olhos eram mais verdes à luz do candeeiro. E, embora o pijama de flanela de ursinhos a fizesse parecer uma adolescente, havia uma figura perfeita sob o tecido. Uma figura de seios empinados, ancas como uma fruta madura e cintura estreita...

Era uma rapariga valente. E não era tola, descobriu um segundo depois.

– Talvez precises de falar disso.

Adam afastou a manta e sentou-se ao seu lado. Os trovões continuavam a ecoar sobre as suas cabeças, mas cada vez pareciam estar mais longe.

Como se metera naquela confusão?

– Não me surpreendo facilmente – encorajou-o Bridget. – Foi-se embora com outro homem?

Olhou para ela, cerrando os dentes. Mas depois sorriu, um pequeno sorriso que não se reflectiu nos seus olhos.

– Como adivinhaste?

– Como disseste que uma mulher te partiu o coração... Não era difícil de adivinhar – Bridget franziu o nariz. – Esse homem devia ter muito para oferecer, porque se não foi assim, estava louca.

– Porque dizes isso?

Bridget apercebeu-se de que falara sem pensar. «Como vou resolver a situação?», questionou-se. Talvez se dissesse verdade...

– Tu és muito bonito e tens muitos recursos em situações de emergência. És forte e... Eu sinto-me segura contigo.

– Obrigado – disse Adam. – Mas nada disso foi suficiente para a reter. Embora, deva admitir que a competição era dura.

– Ou talvez ela não valesse a pena.

– Acabaste de me interrogar, senhora Smith?

– Ah, lamento – disse Bridget, contrita. – Queres mudar de assunto?

Adam levantou-se da cama para aquecer água no fogão, enquanto ela o observava. O candeeiro de parafina não conseguia apagar as sombras do barracão, mas pelo menos, a pior parte da tempestade tinha passado.

– Queres açúcar?

– Uma colher, por favor. Ouve, não te zangues comigo, não queria intrometer-me.

– Não estou zangado – replicou. – Eu também te perguntei pela tua vida. E, pelo menos assim, esquecemos a tempestade.

– E eu contei-te a história da minha vida. Suponho que esperava que tu fizesses o mesmo. Além disso, salvámos a vida um ao outro, não te esqueças.

Adam teve de sorrir.

– Deixou-me pelo meu irmão mais velho – con tou-lhe. – Tens razão, não valia a pena. Mas... Enfim, o meu irmão é outra questão e um dia a vida retri buir-lhe-á o que me fez. Eu encarregar-me-ei disso.

Bridget olhou para o seu perfil, que parecia esculpido em granito.

– Não penso que seja boa ideia. O melhor seria esquecê-los e refazeres a tua vida...

– Bridget, esquece – interrompeu-a.

– Ah, desculpa.

Quando acabaram de beber o chá, Adam voltou a deitar-se na cama e abraçou-a.

– Dorme – disse-lhe. Bridget relaxou, contente por estar assim. Parecia-lhe tão natural, tão agradável, que começou a adormecer...

Adam, por outro lado, deu por si a olhar para a luz da lareira, perguntando-se o que aquela rapariga teria que o fizera contar coisas que não contava a ninguém.

Talvez porque não era ameaçadora ou porque não sabia quem ele era. Sim, era isso, mas havia mais alguma coisa. Sentia o desejo de a proteger e tinha de admirar a sua coragem ao aguentar tudo o que a Natureza atirara contra eles.

Mas havia mais alguma coisa.

Adam questionou-se como seria fazer amor com ela. Como seria abrir aqueles bonitos lábios rosados, que se mexiam um pouco enquanto dormia... Estaria a sonhar?

Como seria dar-lhe um beijo. Que expressão veria nos seus olhos verdes se a iniciasse nos prazeres do sexo e a fizesse esquecer as más lembranças da sua aventura amorosa desgraçada?

«Não seria um castigo, certamente», pensou, sentindo-se excitado. Exactamente o contrário. Parecia ser feita para os seus braços, como se aquele corpo lhe pertencesse...

Bridget abriu os olhos e, durante alguns segundos, entreolharam-se sem dizer nada. Adam susteve a respiração ao ver que nos seus olhos verdes havia uma pergunta, como se tivesse adivinhado os seus pensamentos.

Mas o brilho desapareceu quase imediatamente, como se tivesse decidido que era impossível ou como se fosse um sonho. E voltou a adormecer.

Ele deixou escapar um suspiro, sorrindo. «Não, não seria impossível, Bridget Smith», pensou. E também não era um sonho. Mas não ia acontecer.

Por muitas razões.

Ficou imóvel durante alguns minutos, a ouvir o tamborilar da chuva sobre o telhado, concentrando-se nisso deliberadamente e no facto de quase parecer estar a amar.

Mas, na verdade, a noite não acabara para eles...